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Movimento Beppe Grillo: experiência italiana de ativismo digital que chegou ao poder institucional

Hoje, no II Congresso Internacional sobre Net-Ativismo, o pesquisador Stefano Bory, da universidade Federico II di Napoli, falou sobre a experiência italiana do Movimento Beppe Grillo. O personagem que dá nome ao caso é um conhecido humorista político italiano que sofreu retaliações por fazer críticas à política italiana.

MoVimento

O movimento, que hoje tem 10 anos e conquistou 25% dos votos na última eleição (2013), começou com a criação da rede “Os amigos de Beppe Grillo”. Tratava-se de uma plataforma social, em que as pessoas se cadastram e identificam onde estão no território italiano. Essa relação com o território fez com que grupos regionais se mobilizassem e realizassem atividades e debates presenciais.

Bory relata que o marco do movimento ficou conhecido como “V Day” e aconteceu em 2008, na cidade de Bolonha. A grande participação no evento contou com cidadãos muito heterogêneos e enviou uma forte mensagem de insatisfação política. A partir desta demonstração de força, Grillo lança um referendo popular propondo mudanças no sistema político (como o limite de dois mandatos por pessoa). Ele consegue muito mais do que as 50 mil assinaturas que são exigidas pelo parlamento italiano nestes casos, entrega o projeto com as assinaturas, mas o governo nunca colocou a questão em pauta.

O movimento, que recusa a ideia de “democracia participativa” e defende a “cidadania ativa”, cria então um não-estatuto. Este documento afirma que o movimento tem como sede o blog de Beppe Grillo, ou seja uma plataforma digital. O movimento não se declara um partido político e recusa a participação a pessoas que já tenham experiência em política institucional. O compromisso assumido no documento é o de fazer uma política através das redes, dando à totalidade de usuários o poder da governança.

Em 2011 eles conseguem eleger o primeiro conselheiro municipal e se comportam como o “olho da cidadania” nos espaços políticos de tomada de decisão. Passam a disponibilizar publicamente informações antes restritas a ambientes políticos fechados. Eles não assumem o papel de representantes, mas sim de parte de uma rede. A cada tomada de decisão, eles voltam para a web para consultar as pessoas. Isso logo começa a ser um problema, pois é impossível de consultar a todo momento. Cria-se uma nova plataforma participativa para as eleições 2013 e o movimento obtém 25,5% dos assentos legislativos.

Para Bory, trata-se do exemplo mais concreto que temos hoje de um movimento que surgiu nas redes digitais e conseguiu ter amplo acesso aos espaços da política institucional. Ele alerta, no entanto, para as contradições que emergem deste processo. Primeiro a questão da figura do Beppe Grillo, que dá nome ao movimento e é dono do site onde ele está “sediado”, o que é uma contradição com o espírito horizontal e coletivo do movimento. Além disso, a promessa da participação de toda a rede em cada decisão se mostra impossível na prática, o que começa a gerar insatisfação nos membros. O movimento agora tenta desenvolver uma nova plataforma para facilitar esse compartilhamento das decisões.

Trata-se de um interessantíssimo caso de estudo, sobretudo porque outros países têm experiências parecidas, mas que podem tomar rumos diversos. Agora que exemplos concretos de movimentos desse tipo já podem ser analisados, talvez seja a hora de pensar nas consequências que isso tem para a democracia. Agora que o sonho da internet que facilita e amplia a participação parece estar se concretizando em alguns casos, temos uma democracia melhor?