O “digital labor” ou trabalho digital existe como domínio de estudo há mais de cinco anos e trata-se de uma crítica ao capitalismo digital. A grosso modo, o termo serve para designar as atividades digitais cotidianas pouco ou não remuneradas. O seminário “Estudar a cultura do digital” da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais se dedica a debater questões relacionadas a este tema, sob coordenação do professor Antonio Casilli.
Casilli explica que há dois grandes eixos de estudo neste domínio: os conteudos gerados pelos usuários e os metadados extraídos a partir da utilização dos ambientes virtuais. O professor defende que as ações de usuários no ambiente digital são comparáveis a um trabalho pois: produzem um determinado valor; estão submetidas a um contrato (que seriam as regras de uso); podem ser medidas em métricas de performance; e estão sujeitas a formas de indução (como alertas, convites e notificações).
O tema não é completamente novo e se alimenta em estudos que existem desde os anos 60 e tratam do “trabalho invisível” (invisible labor – como o das donas de casa, por exemplo), do “trabalho imaterial” (immaterial labor – sobretudo relacionado às indústrias culturais), do “trabalho da audiência” (audience labor – que permite por exemplo a venda de espaços publicitários de acordo com quantas pessoas vêem um determinado conteudo) e do “trabalho do consumidor” (consumer work – quando, por exemplo, o próprio consumidor passa suas mercadorias em um caixa automático do supermercado).
Sébastien Broca, que defendeu sua tese de doutorado sobre o tema, destaca que o digital labor não era tema presente no debate público na década de 90, mas que isso começou a mudar. Surgiram tanto movimentos sociais de oposição (como o movimento pelo acesso aberto e pelo software livre) como uma crítica universitária (com autores como Lessig, Benkler e Boyle). Broca destaca que em um momento posterior, mesmo os movimentos de contestação acabam sendo incorporados ao capitalismo e monetizados de alguma forma.
Casilli citou, como exemplo de oposição ao digital labor, o movimento “Europe versus Facebook” que reúne usuários da rede social que demandam maior transparência das redes digitais e um pagamento simbólico por suas ações na rede e pelos lucros que a empresa teve com isso.
Achei a abordagem bem interessante para discutir o que está por tras das ações que fazemos online, mas acredito que é preciso medir até onde essa crítica pode chegar de forma a não invalidar toda e qualquer ação digital. A internet foi criada com espírito libertário e apropriada por empresas capitalistas (afinal, vivemos em um mundo capitalista!). As ações feitas nesse ambiente são, então, amplamente revolucionárias ou simplemente submissas ao sistema?
Quem tiver interesse de ler mais sobre o tema, pode ver o livro:
Qu’est-ce que c’est le digital labor? – Casilli, A. et Cardon, D., 2015